No intervalo entre uma crônica e um conto de Machado de Assis, durante a oficina literária, levantei-me e servi ao grupo umas fatias de pão caseiro trazidas de casa.
Dizem que tenho que sair da minha zona de conforto, sempre escrevendo crônicas bem humoradas. Foi exatamente o que resolvi fazer. Não levei nenhuma crônica para o encontro. Saí do escritório e fui à cozinha. Deixei meu público restrito e atirei-me às massas. Massa de pão mais especificamente. Levei dois recipientes com 16 contadas fatias de pão. Destampei ambos e estendi para o grupo da esquerda e logo em seguida ofereci para o grupo da direita.
Na verdade devo informar aos leitores que era à minha direita ou à minha esquerda, ninguém ali estava preocupado com posições políticas. Machado ensinou-nos que às vezes devemos lembrar ao leitor que ele não faz parte da história, para ele não se condoer de dores por algum personagem e também que não adianta salivar, pois não vai provar nenhuma fatia do cheiroso pão que está sendo compartilhado por vorazes bocas famintas de onze horas da manhã.
Aos olhares femininos, preocupados com a redonda forma, do pão, é lógico, externei, brincalhão, que aquele alimento era light. Em vez das previstas três xícaras de óleo na receita, eu havia colocado apenas meia xícara.
Mais importante que a receita é o momento certo e modo certo de servir. O momento é bem próximo da hora do almoço e a quantidade deve ser tal que todos possam provar, mas apenas alguns possam repetir. O que deixará em todos a sensação de desejo não totalmente satisfeito. A sensação do prazer, próximo do orgasmo, porém sem o gozo.
O mestre, na posição de líder, deu-se ao direito de comer uma segunda fatia para retornar energizado a leitura de outra crônica. Saboreamos Machado enquanto o odor do pão fresco ainda persistia no ambiente e nas mentes.
Ao final da aula, desta vez, não ouvi nenhuma crítica em relação aos meus textos. Nem positiva nem negativa. Várias colegas, gentilmente pediram a receita. Percebi como elogio ao meu trabalho.
Reparei que o professor correu para pegar a derradeira fatia. Foi meu melhor elogio, o gesto demonstrou que gostou de eu ter saído da minha zona de conforto.
Os ingredientes:
2 tabletes de fermento biológico (30g) – utilizei 3 envelopes de 11g com validade vencida e mesmo assim deu certo
1 colher (sopa) de açúcar
1½ xícara de água morna
½ xícara de óleo
1 embalagem de creme de cebola
3 xícaras de farinha de trigo
O modo de fazer:
Unte uma forma de pão. – É bom que a forma seja das grandes (28x11cm) porque a massa cresce um bocado e depois transborda no fogão provocando uma lambança federal além da fedentina de pão queimado. Na dúvida, use duas formas. Um pão você oferece na aula e a outro você come antes da aula
Em uma tigela grande, misture o fermento com o açúcar. Depois acrescente a água, o óleo e o creme de cebolas. Misture.
Adicione a farinha e misture até formar uma massa mole.
Preaqueça o forno em temperatura média – 180ºC
Ponha a massa na forma e deixe crescer por 30 min ou até dobrar de volume.
Leve ao forno por 25 minutos ou até dourar.
Tertúlias são o complemento ideal ao pão.
Quando for levar o pão para a aula não esqueça de deixar o recipiente semi-aberto para impregnar a sala com aroma de desejo.
10 comentários:
Fantástico. Digno de entrar para o aventuras culinárias. Só não foi melhor por que eu não estava na tertulia, logo, não comi do pão. Fiquei apenas com "A sensação do prazer, próximo do orgasmo, porém sem o gozo." Com uma manteiguinha, acompanhada de chá de anis, adoçada com torrones de açucar então...
Show. Cheguei a sentir o sabor, do pão é claro
PS. Estava sentindo falta de te ler. Que bom que voltou.
Obrigado anônimo/a, olha só o e-mail que recebi de Maria Amélia, participante da oficina literária.
Bom dia, Klotz
Maneira criativa de enviar uma receita. Parabéns.
O pão estava mesmo uma delícia. Obrigada.
Bom domingo
Amélia
Estes são comentários ao texto escritos na Comunidade Bar do Escritor do Orkut
Juliano Guerra
Muito, mas muito, bem sacado.
Escrito de maneira impecável.
Aulinha gratuita sobre crônica e otras cositas mas.
Rita Medusa
Putz,que fera Klotz,vc deu outro caminho para toda a rota,da literatura,essa incrementação de receita ficou inusitada
tudo parece tão símbolo.
"Quando for levar o pão para a aula não esqueça de deixar o recipiente semi-aberto para impregnar a sala com aroma de desejo "
Amei que vou levar bolo de margarida e orquídea com chocolate pra minha oficina ......dá a receita Klotz? rs
bjo
Cristiano
Concordo com o pessoal acima...
ficanapaz
Giovani
ó!
Flá
perfeito!
simples e bem feito!!!
Jarbas
Escapuliu com habilidade da zona de conforto. Aliás, nada mais próprio do que o pão saciando a avidez.
Muryel
Klotz é um bom escriba. Tive o prazer de consumir de suas receitas. Pratos finos.
RoSa
Todo ele é bom...
...mas essa frase final é simplesmente perfeita.
Quando for levar o pão para a aula não esqueça de deixar o recipiente semi-aberto para impregnar a sala com aroma de desejo.
E o aroma se espalha pelo ar..beijos Klotz ...lindo texto!
Thais
perfeito!
simples e bem feito!!! 2
Esse é fera.
Klotz
Juliano Paz, Rita me Seduza, Lobovelha, Presidente, Flavitcha, Barba, Mestre, RoSa e Thais - ufa... obrigado pela leitura.
Klotz
Em tempo, atendendo pedido:
Tertúlia: alimento dos que amam conversa temperada com prosa ou poesia.
Barbara
Esse pão está um delícia! Servido com berinjela então chega-se ao orgasmo! rs
Beijos querido!
Klotz
Agora você pode perceber que efetivamente piloto um fogão.
Donde conclua-se que aqueles 6 kg de conserva de berinjela já foi para o espaço.
Avise sua próxima vinda com antecedência (e depois telefone). Beijo.
Sabrina
tinha perdido este? bárbaro!!!
tem mais deste pão não?...rs
Ivone
que deliciosa leitura!!! hum...que vontade comer pão caseiro com manteiga caseira...
que saudades da fazenda! ih, já viajei pro passado!
Ivone
como não faço parte da história, bem este moço escreve de um jeito que parece que tá falando com a gente! muito gostoso de ler.
ükma
Eu quero uma fatia!
delícia de texto
Wilson R.
É isso.
Bela crônica.
Abraços.
Klotz
Para Ivone, Ükminha, Professor e todos os que já comentaram, prometo assar outro pão e enviar uma fatia, ainda quentinha, via e-mail, para cada um de vocês.
Halíssia
nossa, moço, deu água na boca o seu pão! pão com crônica. vou experimentar. gostei muito! rs.
Dom
eu li ontem e achei muito bacana o texto
bem tramado ... e envolvente como o cheiro do pão
vou até pegar a receita ....
abraço
Klotz
Halíssia e Dom – quando vocês fizerem o pão inevitavelmente irão receber elogios e pedidos da receita. Aí, não digam que pegaram a receita no Orkut de um velho metido a besta. Valorizem o resultado. Digam que traduziram de um livro do grand chef Claude Troisgras. Que tiveram que picar cebolas roxas argentinas, que utilizaram azeite grego Mykonos e que as tertúlias também eram importadas.
Hoje recebi outro e-mail de pessoa querida da oficina de literatura:
Tu és craque. Na culinária e na literatura.
Liana
Esta cronica está apetitosa, o pão vira objeto de desejo.Se servido na boca com uma manteiguinha, acompanhada de seu sorriso então...
amei a Tertúlia, mas vou sugerir a vc acrescentar outro ingrediente,ok? vai ficar a tertúlia dos deuses. Delícia!
Estou curioso. Muito curioso.
taí, a curiosidade já o primeiro condimento pra coisa ficar no ponto certo!! rsss
Além de curioso, sou ansioso.
Diga-me, por favor,
eu vos imploro,
qual outro segredo?
esquentar no calor?
iodo ou cloro?
Quero acertar sem medo.
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