11 fevereiro 2008
A corrida por um beijo
– Oi, vô, posso caminhar com você?
– Lógico, meu filho. Não era você que estava empinando pipa ontem à tarde?
– Era sim. Você viu como ela estava alta?
– Eu só vi quando você estava com a pipa na mão, correndo para subir. Uma beleza de amarelo! Se você vier comigo pode chegar atrasado na escola...
– Ainda está cedo. Minha aula só começa às oito.
Achei estranho que aquele menino quisesse caminhar comigo. Eu só o tinha visto meia dúzia de vezes, nos gramados que ficam em volta dos edifícios onde moramos. Ele estava visivelmente querendo falar comigo, sentado na escadaria do prédio esperando eu passar.
O menino colocou-se à minha esquerda e seguimos juntos o meu trajeto rotineiro.
– E qual é seu nome?
– Pedro.
– Eu vi você jogando bola outro dia. Você leva jeito. Mas o chamavam por outro nome. Não era?
– Tico. Tico é nome de criança. Prefiro Pedro. Pedro é meu nome e é de homem. Já fiz onze anos, véi.
– Maravilha. E o Pedro torce para que time?
– Torço para o Botafogo. E o senhor?
– Ah, meu filho, o Senhor está lá no céu. Sou Fluminense. – Certamente o menino não quer discutir futebol, ele está tenso. Resolvo arriscar. – E as meninas?
– Pois é vô, você não se importa se eu chamá-lo de vô. Não é?
Parece que acertei, pensei comigo, ele está com algum problema em relação a alguma menina.
– Gosto que me chamem vô. Não gosto quando me chamam de seu isso ou seu aquilo. Em que posso ajudá-lo?
– É que eu gosto da Carolzinha. Já pedi pra namorar com ela e agora apareceu o Joca e quer atrapalhar tudo. Ele também quer namorar ela.
– A Carolzinha deve ser muito bonita...
– Ela é linda. E eu acho que ela gosta de mim enquanto a turma acha que sou muito pirralho pra ela.
– Pirralho?
– Ela tem doze anos e é um pouco maior que eu. Mas só um pouquinho.
– E porque você acha que o vovô pode ajudá-lo?
– É que a síndica falou que você é mó namorador.
– Mas isso é fofoca. Era só o que me faltava. Ela não tem mais o que fazer?
– Eu já vi você caminhando de mãos dadas com várias mulheres diferentes...
– Tá bem, espertinho, vamos retomar a conversa da Carolzinha, isso é o que interessa. Se a Carolzinha gosta de você e você gosta dela por que o Joca iria atrapalhar tudo?
– O Joca é mó bom. È ele que tira par ou ímpar para escolher os times. È só ele que sabe andar de bike na roda de trás. È ele que tira mó onda de sabe-tudo. As meninas só querem saber dele. A turma toda já tá torcendo para ele.
– Então a coisa tá preta. E você acha que a Carolzinha vai cair na onda dele?
– Acho. A Zeca me sacaneou. Inventou uma corrida. E quem ganhar, ganha um beijo da Carolzinha. Mó sacanagem! Tô afim da Carol há muito mais tempo e o Joca é bem maior do que eu e corre mais. Tô ferrado!
Nem perguntei mais detalhes do Joca nem da Zeca para não tirar o foco da preocupação do menino.
– A corrida já está marcada?
– Já. É na semana que vem. A Zeca disse que assim eu teria tempo de treinar. E deu mó gargalhada na minha cara!
– Quer dizer que quem ganhar a corrida ganha um beijo como se fosse aquela medalha olímpica? É isso?
– É isso, vô. Tô ferrado!
– E o Joca, com aquela cara de maioral, ainda disse que me dava 3 metros de vantagem. Filho da mãe!
– E onde vai ser a corrida?
– A Zeca disse que eu poderia escolher qualquer lugar, que o Joca vai ganhar mesmo.
– O Joca também estuda aqui na escola?
– Estuda. Por que? Você não vai falar com as tias, vai?
– Jamais. Isso é coisa de homem. Coisa de homem para resolver como homem.
– O Joca nem quer namorar com a Carolzinha, ele só quer tirar onda e mostrar que ele é o bonzão, o fodão.
– Eu acho que você deve marcar o dia e hora lá na escola.
– Isso é tudo o que ele quer. Aparecer!
– Você deve escolher a hora que tiver mais gente para ver a corrida.
– Para gritarem o nome do Joca? É campeão! É campeão! É campeão! Beija! Beija! Beija! Nunca. È muita humilhação.
– E se for o contrário?
– Contrário como? Não existe a menor chance de eu ganhar a corrida.
– Faça o seguinte: diga que topou o desafio e marque com a turma o dia e a hora na escola. Ainda faça uma provocação que você já está treinando para beijar. Deixe para dizer aonde será a corrida para a última hora.
– Eu hein? Na escola só tem o pátio. Não tem jeito.
– Você quer ou não quer ganhar aquela medalha olímpica?
– Claro, né, vô. Eu amo a Carolzinha.
– Você tem a vantagem de 3 metros não tem?
– Tenho, mas é muito pouco.
– Na última hora diga que é na escadaria da escola. Escada acima. São apenas três andares. E comece a treinar desde já.
Pedro abriu mó sorriso e saiu correndo.– Valeu, véi.
– Lógico, meu filho. Não era você que estava empinando pipa ontem à tarde?
– Era sim. Você viu como ela estava alta?
– Eu só vi quando você estava com a pipa na mão, correndo para subir. Uma beleza de amarelo! Se você vier comigo pode chegar atrasado na escola...
– Ainda está cedo. Minha aula só começa às oito.
Achei estranho que aquele menino quisesse caminhar comigo. Eu só o tinha visto meia dúzia de vezes, nos gramados que ficam em volta dos edifícios onde moramos. Ele estava visivelmente querendo falar comigo, sentado na escadaria do prédio esperando eu passar.
O menino colocou-se à minha esquerda e seguimos juntos o meu trajeto rotineiro.
– E qual é seu nome?
– Pedro.
– Eu vi você jogando bola outro dia. Você leva jeito. Mas o chamavam por outro nome. Não era?
– Tico. Tico é nome de criança. Prefiro Pedro. Pedro é meu nome e é de homem. Já fiz onze anos, véi.
– Maravilha. E o Pedro torce para que time?
– Torço para o Botafogo. E o senhor?
– Ah, meu filho, o Senhor está lá no céu. Sou Fluminense. – Certamente o menino não quer discutir futebol, ele está tenso. Resolvo arriscar. – E as meninas?
– Pois é vô, você não se importa se eu chamá-lo de vô. Não é?
Parece que acertei, pensei comigo, ele está com algum problema em relação a alguma menina.
– Gosto que me chamem vô. Não gosto quando me chamam de seu isso ou seu aquilo. Em que posso ajudá-lo?
– É que eu gosto da Carolzinha. Já pedi pra namorar com ela e agora apareceu o Joca e quer atrapalhar tudo. Ele também quer namorar ela.
– A Carolzinha deve ser muito bonita...
– Ela é linda. E eu acho que ela gosta de mim enquanto a turma acha que sou muito pirralho pra ela.
– Pirralho?
– Ela tem doze anos e é um pouco maior que eu. Mas só um pouquinho.
– E porque você acha que o vovô pode ajudá-lo?
– É que a síndica falou que você é mó namorador.
– Mas isso é fofoca. Era só o que me faltava. Ela não tem mais o que fazer?
– Eu já vi você caminhando de mãos dadas com várias mulheres diferentes...
– Tá bem, espertinho, vamos retomar a conversa da Carolzinha, isso é o que interessa. Se a Carolzinha gosta de você e você gosta dela por que o Joca iria atrapalhar tudo?
– O Joca é mó bom. È ele que tira par ou ímpar para escolher os times. È só ele que sabe andar de bike na roda de trás. È ele que tira mó onda de sabe-tudo. As meninas só querem saber dele. A turma toda já tá torcendo para ele.
– Então a coisa tá preta. E você acha que a Carolzinha vai cair na onda dele?
– Acho. A Zeca me sacaneou. Inventou uma corrida. E quem ganhar, ganha um beijo da Carolzinha. Mó sacanagem! Tô afim da Carol há muito mais tempo e o Joca é bem maior do que eu e corre mais. Tô ferrado!
Nem perguntei mais detalhes do Joca nem da Zeca para não tirar o foco da preocupação do menino.
– A corrida já está marcada?
– Já. É na semana que vem. A Zeca disse que assim eu teria tempo de treinar. E deu mó gargalhada na minha cara!
– Quer dizer que quem ganhar a corrida ganha um beijo como se fosse aquela medalha olímpica? É isso?
– É isso, vô. Tô ferrado!
– E o Joca, com aquela cara de maioral, ainda disse que me dava 3 metros de vantagem. Filho da mãe!
– E onde vai ser a corrida?
– A Zeca disse que eu poderia escolher qualquer lugar, que o Joca vai ganhar mesmo.
– O Joca também estuda aqui na escola?
– Estuda. Por que? Você não vai falar com as tias, vai?
– Jamais. Isso é coisa de homem. Coisa de homem para resolver como homem.
– O Joca nem quer namorar com a Carolzinha, ele só quer tirar onda e mostrar que ele é o bonzão, o fodão.
– Eu acho que você deve marcar o dia e hora lá na escola.
– Isso é tudo o que ele quer. Aparecer!
– Você deve escolher a hora que tiver mais gente para ver a corrida.
– Para gritarem o nome do Joca? É campeão! É campeão! É campeão! Beija! Beija! Beija! Nunca. È muita humilhação.
– E se for o contrário?
– Contrário como? Não existe a menor chance de eu ganhar a corrida.
– Faça o seguinte: diga que topou o desafio e marque com a turma o dia e a hora na escola. Ainda faça uma provocação que você já está treinando para beijar. Deixe para dizer aonde será a corrida para a última hora.
– Eu hein? Na escola só tem o pátio. Não tem jeito.
– Você quer ou não quer ganhar aquela medalha olímpica?
– Claro, né, vô. Eu amo a Carolzinha.
– Você tem a vantagem de 3 metros não tem?
– Tenho, mas é muito pouco.
– Na última hora diga que é na escadaria da escola. Escada acima. São apenas três andares. E comece a treinar desde já.
Pedro abriu mó sorriso e saiu correndo.– Valeu, véi.
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2 comentários:
Adorei. Todas as estratégias são válidas para ganhar um beijo da pessoa amada.
Como sempre com final criativo e inteligente. MUUUIIITO bom.
Mais uma crõnica digna de ir para o seu livro - "Quase Pisei". Cada dia ele fica melhor. Fico louca para saber as novas aventuras que estão por vir. Terei que ganhar uma segunda edição em breve. O meu exemplar está ficando desatualizado.
bjs
Opa!
Gostei.
Abraços,
*CC*
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