07 janeiro 2020

Ressaca do réveillon



O ano recém começara e nos encontramos num barzinho para reabastecer o tanque que já estava na reserva.
Nós éramos em cinco embora Lúcio afirmasse sermos nove e Toninha apostar no número sete.
— Então vamos contar de novo.  — sugeri.   — Neco, Paulinha, Lúcio, eu, Zé e Toninha.
Lúcio bateu a mão na mesa. — Eu num falei! Somos sete!
— Peraí! Pediu a Toninha. — Exijo recontagem.  A gente começa com a Paulinha para não contar duas vezes.
O Lúcio apontou para a Paulinha e depois foi seguindo o dedo para o lado e todos, em coro, contaram.
— Um , dois, três , quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze...
Neco interrompeu a contagem.
— Para. Para. Para.  —Tu seguiu — e apontou para o pessoal da outra mesa.
— Só tão sentados na outra mesa. Mas quem é que não conhece a Lili, o Paulão, a Fê e os outros quatro que estão com eles?
 Interrompi com autoridade: — Aquela não é a Fê. A Fê tem uma boquinha carnuda deliciosa. Essa á a irmã dela. Ainda não sei se a boca carnuda é deliciosa. E tem mais, além da Lili, do Paulão e da irmã da Fê são só mais dois e não mais quatro.
— Bora contá de novo — sugeriu Neco.
Vamos não, — cortou Toninha. — hoje é dia de prometer, comprometer, de se engajar nas promessas. Assumir responsabilidades. Esquecer medos. Anunciar um projeto para melhorar o mundo.
Lúcio ergueu o copo num brinde às palavras da Toninha e perguntou qual era a sua resolução salvadora para o ano nascente.
— Vou pintar meu cabelo. Serei loira. Serei a loira mais gostosa do planeta.
Lúcio sem desmentir a gostosura da Toninha: — Mas o seu cabelo já é loiro.
— É que eu prometo retocar de 15 em 15 dias. E tu Lúcio, o que vai ser?
— Caraca, nem pensei. Acho que eu tenho que terminar a faculdade.
O garçom, de passagem, pensou que deveria cobrar os dez por cento antes de o pessoal começar a beber.
A Lili, sem ser perguntada, ajeitou os peitões no decote e disse que a sua resolução era não mais usar calcinha mesmo de vestido.
Paulão, lá da outra mesa, levantou-se com olhar vermelho e sedento:
— Eu prometo solenemente, para quem quiser registrar em cartório, que neste ano, semana a semana comprarei uma saia para a nossa querida Lili.
A irmã da Fê beliscou o Paulão na barriga.
Paulinha cutucou o Neco que já estava com o tanque cheio.
— Eu prometo que vou começá a procurá emprego.
— Essa é velha. Não pode. Mande outra.
— Tá bem. Prometo bebê menos.
 O garçom palpitou que o Neco poderia ao menos prometê pagar suas contas.
Olhei em volta. Todos os cinco, ou sete ou nove já haviam externado decisões para o novo ano. Era a minha vez.
Eu já estava tomando água fazia duas horas.  Disse que tomara a resolução firme e forte, encantava a vida ou desencantava a morte: vou acabar com meus cabelos brancos, extinguir a barriga, eliminar as rugas da face. É irreversível: vou rejuvenescer.

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