29 junho 2011

Torradinha exibida




Restaurante novo e aconchegante.

Sentei-me próximo da janela.

Toalha e guardanapo de linho.

Recebi gentileza e cardápio.

Enquanto tomava chope gelado e cremoso

virei páginas, salivei opções.

Qual será a especialidade da casa?

Senhor garçom, por favor,

─ Qual é o prato mais solicitado?

─ É o couvert, senhor.

─ Obrigado. Anote um filé com fritas.

20 junho 2011

Desmoralização



A van preta com a caveira do BOPE – Batalhão de Operações Policiais Especiais – estacionou na frente da favela da Rocinha. Desceram quatro policiais fortemente armados. Com cara de poucos amigos, olharam para os dois lados, antes de seguir em frente, quando um flanelinha perguntou se poderia vigiar.

16 junho 2011

Sarau do Caribe


Peço desculpas, hoje estou muito nervoso. Passei uns dias muito malucos e agora venho falar na frente de tanta gente sem ter preparado o meu texto. Eu não trouxe nenhum texto para ler desta vez.

Quando o Marco Antunes, organizador do sarau, me convidou para escrever um texto sobre o Panamá e Porto Rico fiquei muito orgulhoso. Seria a oportunidade de falar sobre a genial construção do famoso canal pelo engenheiro Ferdinand Lesseps o mesmo que construiu o canal de Suez. Eu poderia dizer que 13mil navios ou 4% do comércio marítimo mundial, passam anualmente por ali. E que o Pacífico é 24 centímetros mais alto que o Atlântico.

Sobre Porto Rico eu diria que é a quarta maior ilha do Caribe. Com área equivalente a dois distritos federais. E que a economia é muito dinâmica e diversificada onde se instalaram empresas multinacionais de farmacêutica, eletrônica, têxtil, petroquímica e até biotecnologia.

É o que eu diria, mas o Marco disse que não queria nenhuma aula de geografia ou economia. Ele queria uma história que se passasse na região.

Então, acabei telefonando para o meu amigo Paco Rodrigues, morador de San Juan, para me contar sobre a vida de Porto Rico e, quem sabe, a partir dali fazer uma crônica.

Muito melhor que palavras, ele me convidou para passar uns dias com ele.

Na mesma noite comprei passagem. Faria um vôo com escala em Miami na ida e na volta faria escala na cidade de Panamá. Tudo o que eu queria. Viajei no dia seguinte.

Fiquei em Miami apenas o tempo suficiente para trocar de avião e rumar para Porto Rico.

Encostei a cabeça na poltrona pensando em finalmente descansar da correria. Na revista de bordo li uma ampla reportagem sobre o Triângulo das Bermudas, onde barcos, navios e aviões desaparecem misteriosamente. Foi aí que o avião entrou numa zona de turbulência impressionante. Repentinamente todas as luzes se apagaram e caímos em queda livre no escuro.

O grito dos desesperados amainou e passei a ouvir o som de uma flauta. Fomos pousados suavemente no alto de uma pirâmide. A pirâmide do Sol. Fomos recebidos por um Deus, Quetzalcoatl, uma serpente ricamente emplumada. Disse que estávamos ali para ser sacrificados, oferenda necessária para o Sol nascer todos os dias.

Aleguei que eu não poderia ser sacrificado porque deveria falar do Caribe num sarau em Brasília, terra de muitas pirâmides. De nada adiantou. Aí eu apelei. Disse que eu era um sacerdote e que faria a lua desaparecer naquela noite se não fossemos todos libertados. O eclipse de ontem à noite aconteceu e acabamos homenageados em uma cerimônia com muito chocolate cultivado e produzido pela nação asteca e maia. Fui liberado bem a tempo de comparecer ao sarau e trazer este chocolate, oferecido pelo deus Quetzalcoatl ao organizador.

09 junho 2011

Precisamos falar sobre o Kevin


“Precisamos falar sobre o Kevin” de Lionel Shriver é um fantástico romance ficcional escrito em forma de sucessivas cartas como se fossem capítulos.

Uma mulher americana transcreve ao marido a própria transformação de executiva bem sucedida em mãe de um serial killer. As cartas são uma sucessão muito bem escritas e convincentes de angústias, sofrimentos, sentimento de culpa e inocência, acusações sofridas e punições impostas pela sociedade, lembranças boas e más. O tema, tantas vezes abordado em livros e cinema (Beautiful boy, Bang bang you’re dead, A torre da morte) agora é mostrado do ponto de vista da mãe que se coloca como inocente apesar da condenação implacável da sociedade e mostra como qualquer família pode a qualquer tempo, aparentemente, sem mais nem menos, gerar um filho assassino. Isto é, com verossimilhança e altas doses de ironia a situa e identifica o leitor como pai ou mãe do personagem assassino.

A autora, em linguagem intimista e atual, fala do tipo de crime onde um atirador dispara sobre inocentes em lugares públicos ou escolas parecia e que parecia restrito aos americanos, entretanto provocou vítimas em escolas na Europa e, mais recentemente, também no Brasil. Esperamos que este tipo de crime hediondo, agora universal, fique restrito, pelo menos, à nossa época.

A história é densa e tensa, envolvente e emocionante. Muitas ações e histórias paralelas constroem um romance para ser lido um só fôlego, sem interrupções. Não é à toa que recebeu elogios da crítica internacional e desponta entre os grandes best sellers americanos.

08 junho 2011

Alegria para os cronistas brasilienses


O Crônicas da Cidade vai acolher textos produzidos por cronistas do jornal e por cronistas-leitores. As crônicas devem ter como objeto de inspiração a capital do país, o modo de vida dos brasilienses, os invisíveis viveres cotidianos, as mudanças de humor do céu, os sufocamentos de agosto, os sabores, odores, tremores e dissabores da cidade que tantos amam e que tantos não conseguem entender e vivem de maldizê-la. – CB, Crônica da Cidade, 08/06/2011.



Antes mesmo do jornal ser entregue na minha porta, a serra elétrica da construção vizinha já atazana meu começo de dia. Como vou passar manteiga e tomar o meu o café com um barulho desses?

Todas as quartas-feiras começam assim. Apocalipses cíclicos, zumbidos infernais, tempestades zodiacais.

Há 40 quartas-feiras me proponho a escrever um texto bem-humorado motivado por uma matéria publicada no jornal durante a semana. Deve ter exato número de caracteres e ser publicado no meu blog antes das seis da tarde.

Esta manhã de quarta-feira começou rápida nos ponteiros do relógio. Nada recortei durante a semana. Ainda não escolhi o tema. Preciso encontrar um mote no jornal de hoje. Política? – Não, ninguém se interessa por políticos. Internacional? – Não. Penso que os leitores preferem temas locais. Economia? – Basta de inflação! Tecnologia? Saúde? Ciência? Esportes? – Já falaram tudo sobre o jogo de despedida do Ronaldo, não há nada para acrescentar. – Ai meu deus! – Li mais um caderno e ainda não fui balançado por uma notícia. Cidades? – Gosto do caderno, sinto-me em casa. Cassação da deputada? Caixa de Pandora? Social? Celular para controle de freqüência nas escolas? – Hum, muito interessante. Atropelamentos e greve de ônibus, são notícias ruins, difícil fazer graça. Crônica da cidade? Um blog para os cronistas. – Um blog para os cronistas? Uêba! Tudo o que eu sempre quis!

A serra elétrica parou. O apocalipse montou seu cavalo negro e saiu a galope. O céu se abriu para a motivação para escrever nesta e em várias outras quartas-feiras. Agora basta ajustar o teclado à frente e digitar com entusiasmo.

A cidade ferve de cronistas ansiosos por um lugar nobre para expor escritos e uma voz grita:

– Levante o dedo quem quer escrever no Correio.

Meus dois indicadores apontam para o céu. Lá no alto encontram outras dezenas de mãos frequentadoras de saraus, blogs e oficinas literárias. Todos os escritores são ávidos por leitores.

Só que o tempo do cronista corre mais rápido que o dos outros mortais: precisa entregar o texto antes de terminar o prazo.

Quero entregar logo meu trabalho para ser dos primeiros a ter um texto publicado no blog. Tenho pressa. Baixo meus dedos e os agito sobre o teclado.

Enquanto os dedos dançam no palco das letras, a mente conta e confere o número de letras, espaços e parágrafos previamente estabelecidos pelo editor. O sorriso de realização chega junto com ponto final. A serra elétrica só voltará na outra semana. Um bem-te-vi anuncia a chegada de outro texto.

 
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