30 abril 2013

O retorno

Dulce Maria Cardoso

Editora Tinta da China

Capa dura e 272 páginas

R$ 37,90



A contracapa informa que este foi o livro do ano em Portugal com o Prêmio Especial da Crítica em 2011. “Que em 1975, um ano após a Revolução dos Cravos, Portugal perde suas colônias. Em poucos meses, o país recebe mais de meio milhão de retornados, que de uma
hora para outra precisam abandonar suas casas.” E é nesse contexto que o adolescente e narrador nascido em Luanda, capital de Angola conta sua trajetória pessoal.

Não é a primeira vez que encaro um texto com português de Portugal. Aluguer é aluguel. Connosco é conosco. Mota é motocicleta. Bazar é vazar no sentido de sair. Nada que assuste. São palavras bastante óbvias que não merecem nem uma pequena parada de estranhamento. Este livro é um pouco diferente por somar o lusitano angolano e o narrador introduz dizeres do quimbundo – língua nativa de Angola. Matabicho é desjejum. Geleira é geladeira. Machimbombo que em Portugal é autocarro para nós é simplesmente carro. A expressão “vai dar maca” significa que “vai dar problema”. O estranhamento passa logo e a leitura flui com naturalidade. A linguagem é simples e acessiva. Não há metáforas, figuras de linguagem ou rebuscamentos para tornar a linguagem literária. É uma história contada por Rui, uma pessoa do povo.

Rui é um adolescente quase alienado ao que acontece em torno de si. Talvez alienado não seja a palavra correta. Ele é um adolescente que percebe e vive as transformações típicas de qualquer adolescente: as transformações hormonais. Nesse contexto e convivência percebemos que as grandes transformações históricas e políticas e acontecem em torno dele. Um país negro colonizado e oprimido por portugueses brancos pega em armas para expulsar os invasores.

Ainda no começo da história em vez de descrever o cenário, Rui mostra sem nenhuma sutileza como se relaciona e pensa. “Com o Gegé e com o Lee é diferente, passávamos horas a falar de como seria fazer ginga ginga com raparigas brancas, sabíamos que não era a mesma coisa do que fazer com as pretas que nem cuecas usam e fazem aquilo com qualquer um e se quisermos até fazem com dois ou três em seguida, a Fortunata uma vez fez com sete, uns a seguir dos outros, até fizemos fila como na cantina do liceu. O Gegé é o único que já fez ginga ginga com uma branca, a Anita.” Poucas páginas adiante Rui informa que as raparigas brancas já não se atreviam a sair de casa e que “se um branco na rua é uma provocação, uma rapariga branca é uma provocação ainda maior. Até o preto que durante cinco anos engraxava os sapatos ao domingo de manhã avisou a minha irmã numa das últimas vezes que o vimos, cuidado menina que ainda te fazem o mesmo que os brancos fizeram às nossas mulheres.” Percebe-se a tensão aumentando, várias famílias fogem da revolta iminente enquanto a família do protagonista se apega à casa e valores construídos enquanto moravam em Luanda até que o pai de Rui é preso pelos revoltosos e a família acéfala desesperada foge para Portugal. A história ganha ainda mais dramaticidade no abrigo improvisado onde desconhecem o destino e questionam se o chefe da família está vivo ou morto.

É um romance morno e bastante repetitivo acontecendo num cenário e momento histórico efervescente. A autora não tomou partido nem se envolveu em questões políticas de modo que os portugueses puderam identificar a si ou pessoas do seu relacionamento tornando o livro um sucesso retumbante no país onde foi escrito. Para nós, brasileiros carece pesquisa para contextualizar a história.

A autora tem estilo e o livro somou conhecimento histórico.

01 abril 2013

Primeiro de abril

1.o de abril 


Prezado Chefe,



Peço demissão em caráter irrevogável. Tenho sido sabotado sistematicamente por colegas de trabalho. Não tenho mais condições de trabalhar aqui na repartição que foi a minha casa nestes últimos 35 anos.

Atenciosamente,

... von Silva





Meu chefe recebeu o bilhete com um sorriso no rosto. Meu chefe é bem humorado.

Ele carimbou aprovado, datou e disse que nunca imaginou que seria tão fácil se livrar de mim.







Texto não publicado no livro Cara de crachá, cujo protagonista é von Silva.
 
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