24 setembro 2008

Uma tragédia no terceiro milênio

Face anterior do sarcófago de Fedra. Data: AD 290. Paris, Musée du Louvre. Foto: Marie –Lan Nguyen



Apresentação das personagens


Fedra nasceu em berço de ouro, não era uma suburbana qualquer, tinha árvore genealógica repleta de gente da alta sociedade. Era de linhagem nobre com descendência direta do Rei Sol. Sempre teve tudo o que quis. Bela, exercia grande fascínio sobre os homens. Habituou-se a exercer sua magia para conquistar o que desejava. Caprichosa, passional, fútil, ninfomaníaca. Ainda muito cedo descobriu que o que interessava aos meninos estava um palmo abaixo do seu próprio umbigo. Usou esse conhecimento para obter vantagens e livrar-se dos inimigos. Rumores dão conta de que teria sofrido abuso sexual na primeira infância o que explicaria algumas de suas atitudes adultas. Freud, sem constrangimento, a rotularia de perversa.

Teseu, viúvo, era jogador inveterado. Somou fortuna arrasando seus adversários, tomando-lhes automóveis, casas e mulheres. Compulsivo fumante de charutos cubanos e uísque escocês. Exibia as mulheres mais bonitas do planeta. Gostava da companhia das mulheres, dizia que eram amuletos. Usava-as como um colecionador, mantendo-as intocadas, talvez para não estragá-las. Mantinha uma suíte nupcial especialmente para as suas conquistas. Os empregados diziam que a suíte era freqüentada apenas mensalmente. Freud, certamente diria que Teseu, apesar do sugestivo nome, era impotente.

Hipólito, filho de Teseu e Antíopa. Possuía cachos dourados e um corpo de abalar Atenas. Freqüentava academias de ginástica e dança moderna. Com seus discursos a favor da castidade repelia as investidas femininas. Vaidoso a ponto de gastar horas modelando os cabelos anelados protegidos por uma redinha sempre que saía com a Porshe amarela conversível, presente do pai. Visionário, triunfou como produtor musical, sendo responsável pelo sucesso de grupos como ABBA e Village People. Dizem que foi precursor no uso de anabolizantes e depilação completa para homens.

Breve resumo dos fatos — surge o conflito

Conheceram-se em Nova Iorque numa das noitadas promovidas no Studio 54 por Andy Warhol. Fedra foi ao encontro de Teseu com um Valentino negro, sóbrio, poderoso e colante. Estava arrasadora. Teseu exibiu Fedra durante uma semana antes de se casarem. A lua-de-mel foi inesquecível: a esposa, em casa, na Califórnia e o marido em um cassino no Arizona. Durante uma semana a fogosa e entediada mulher aproveitou para conhecer e explorar toda a mansão levada pela doce mão de Hipólito.

Alegando negócios, Teseu estava sempre ausente de casa. Enquanto isso Fedra ensinava os mistérios da maquiagem ao enteado que retribuia com massagens. Fedra se apaixonou e presenteou Hipólito com uma coleção de barbies.

Apesar da maravilhosa esposa, Teseu visitava o quarto nupcial apenas uma vez por mês, quando não estava viajando, de modo que a única alegria de Fedra era apreciar o corpo bronzeado e escultural de Hipólito na beira da piscina. Não havia mulher que não se apercebesse da fome da paixão nos olhos de Fedra,

Teseu passou o Natal de 2004 na Indonésia e não voltou. Fedra concluiu que a grande tsunami matou Teseu, e se declarou a Hipólito.

O conflito se agrava — anuncia-se a tragédia

Uma noite Fedra entrou silenciosa no quarto de Hipólito. Acendeu uma luz suave ao som do rouco Joe Cocker cantando “You can leave your hat on”. Tirou todas as peças devagar, mordendo os lábios, movendo os quadris em “Nove e meia semanas de amor”. Nenhum homem resistiria àquela boca carnuda implorando desejos. Hipólito jogou-a em cima da cama. Fedra antecipa o prazer imaginando uma longa noite de lascívia selvagem. Entrega-se.

Antes do tapa explodir em seu rosto ouviu-o, aturdida, mandando-a embora e ameaçando contar tudo ao pai.

Epílogo — A tragédia se consuma

A reação de Hipólito lançou-a num mar de medo, rejeição e ódio.

Sentiu-se a mais vil das criaturas, desprezada e repelida como um cão sarnento. A dor da rejeição transformou amor e tesão em medo e ódio mortal.

Assim que Teseu chegou de viagem, Fedra acusou Hipólito de tê-la violado sem chances de defesa.

Furioso, Teseu reuniu amigos que lhe deviam favores e encomendou a morte do filho.

Os jornais do dia seguinte estamparam, na primeira página, fotos da Porshe amarela caída num penhasco. A nota apontava que uma overdose teria sido a causa do acidente, uma vez que a polícia encontrou dois papelotes no porta-luvas e outro no bolso do morto.

Fedra presenciou o enterro com um sorriso misterioso antes de tomar 150 comprimidos de Lexotan ao som do piano de Ravel interpretando “Pavane pour une enfante défunte”.

2 comentários:

Anônimo disse...

Esse me deixou deprimida.
Como diria um amigo nosso,"tasquepariu" bom demais.

Klotz disse...

Obrigado. Este texto e os dois anteriores, são resultado de um desafio a escritores promovido pelo Núcleo de Literatura da Câmara dos Deputados.

 
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