05 janeiro 2011

Consulta a Nostradama



Depois de a prestigiada Journal of Psichology publicar um artigo no qual o pesquisador Daryl Bem, da Universidade de Cornell, afirmar que, sim, é possível predizer o futuro. Ainda argumentou: o que eu sei é que os dados que obtivemos indicam que é possível prever o futuro, mas é necessário mais investigação para explicar solidamente esse fenômeno. CB – Ciência 31/12/2011
Para tudo existe a primeira vez. A primeira sopa de espinafre, o primeiro galo na testa, o primeiro logro, a primeira transa, a primeira falha, a vigésima desculpa. Naturalmente, nem tudo acontece ao mesmo tempo e nem sempre nos lembramos da estréia de todos os fatos na nossa vida. Eu, por exemplo, não me lembro de ter encontrado com o síndico sem um pedido para aumentar a taxa de condomínio. Talvez a primeira vez nem tenha existido.
Pois o meu amigo se lembra da primeira ida a uma astróloga. Disse que na porta da frente havia um cartaz anunciando que Dona Safira predizia o futuro através da leitura de búzios, tarot ou bola de cristal. R$ 100,00 adiantados.
Jotabê é um sujeito incredulamente crédulo. Ou seja, desconfiado como roceiro quando vê uma escada rolante pela primeira vez. Vê, desconfia, examina, passa a acreditar e confiar. Aí sobe e desce como se houvesse escada rolante no galinheiro.
Tocou na campainha e uma mulher enrugada estendeu a mão cheia de anéis e ofereceu uma cadeira ao meu amigo. Este, sem dizer palavra, observou detalhadamente o ambiente multicolorido de velas e cheiros. Sentou-se na frente da mulher de vestido estampado de flores lilás e entregou uma nota verde.
– Eu quero que a senhora diga quantas moedas eu tenho no bolso da minha calça.
Ela recolheu as cartas e juntou num montinho. Fixou o olhar nos olhos de Jotabê e disse:
– O número de pratas do seu bolso reflete um ato passado que quer fazer presente. No cartaz está claro que Dona Safira prevê o futuro, não adivinha o agora. Entretanto eu antevejo que você vai tirar as moedas do bolso na primeira oportunidade.
Meu amigo colocou a mão no bolso e mostrou uma moeda do tempo do Império.
– A senhora acertou. É prata, sim. Eu vim aqui para saber do meu destino na empresa em que trabalho.
– Você ainda não faz por merecer uma promoção. – Foi a resposta rápida. – São cem reais.
– Mas a senhora nem consultou as cartas, os búzios ou a bola!
– Não é preciso. É uma resposta padrão. Nada se consegue sem esforço.
– Onde estão os búzios?
– Minha filha levou. Outra pergunta. Mais cem reais.
– Mas isso é picaretagem. A senhora não é astróloga coisa nenhuma.
– Em nenhum momento eu disse isso. Você entrou, me deu cem reais e deduziu que eu era a minha filha. Eu deduzi que ia ganhar dinheiro fácil.
Jotabê disse que se levantou, falou dois palavrões, virou as costas, saiu e bateu a porta.
Odiou-se pela nota perdida, pela moeda esquecida, pela fé abalada e principalmente por ter sido logrado com tanta estupidez.
Se as pessoas pudessem prever o futuro, ele não entraria por aquela porta, nem a primeira vez.


O Ano Novo chegou. Com ele renovam-se as energias para ser publicado numa grande mídia.
Acima, mais um conto inspirado em uma notícia do Correio Braziliense desta semana. A publicação no blog é sempre às quartas-feiras antes das 18 horas. Como numa coluna de jornal, o tamanho é fixo entre 2957 e 2997 caracteres.

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