11 maio 2011

A salvação dos sapos


A súbita extinção do sapo-dourado e do sapo-arlequim da reserva ambiental Monteverde, na Costa Rica, é um dos casos mais bem documentados dos declínios populacionais misteriosos que caracterizam a crise global dos anfíbios. O subsequente desaparecimento de 40% das espécies de anuros (grupo de anfíbios que não possuem cauda) das florestas tropicais porto-riquenhas é um dos casos mais extremos de perda de biodiversidade. – CB Ciência, 10/05/2011.




Conheci o porto-riquenho, Paco Gonzales, ainda adolescente. Ele participou de um programa de intercâmbio e morou seis meses na casa do meu vizinho. Paco era engraçado e conquistador nato. Com o sotaque portunhol dizia que seu pai tinha sido um sapo que, ao ser beijado, se tranformara em príncipe. E que ele era nascido príncipe, e que de acordo com a lenda do seu país, precisava ser beijado por uma princesa para virar rei. Magras, pobres, altas, com ou sem óculos, beijava todas. Transformou-se em rei do bairro.

Já biólogo, retornou ao Brasil, na virada do século, para um congresso. Eu o hospedei durante dez dias. O suficiente para recordar histórias de sapos, rãs e pererecas.

Um dia tive a oportunidade de visitá-lo em San Juan. Fiquei muito bem impressionado com o mar transparente na vista aérea e o moderno aeroporto. No caminho para casa ele me relatou que estava muito preocupado com a morte misteriosa dos anfíbios do arquipélago. Os estudos levavam a crer na diminuição na população de salamandras, cobras-cegas, lagartos e na extinção de sapos, rãs e pererecas. O caso mais grave era com os anuros, anfíbios sem cauda.

Na manhã seguinte visitamos o centro da cidade, declarado Patrimônio Histórico pela Unesco. E à tarde fomos ao laboratório de Paco.

Conforme suas pesquisas e comprovação de imagens observou que os sapos nasciam e se desenvolviam felizes até começarem a frequentar a escola e a sociedade nas lagoas. Ali entravam em contato com outras espécies e assumiam feições tristes. Relatou-me que a transformação era impactante, imediata. De sorridentes passavam a chorões depressivos. E da depressão à morte tudo acontecia muito rápido.

Descobriu que os sapos se envergonhavam pela ausência de uma cauda. Comprovou a tese quando começou a cortar o rabo de lagartos e cobras: todos morriam de vergonha.

Mas Paco era estudioso e perseverante. Analisou centenas de bichinhos, até encontrar uma solução para os infelizes. Agora estava orgulhoso, se aproximava a hora de mostrar ao mundo o resultado do seu trabalho. Apontou-me uma enorme caixa com uma encomenda, antes de abrir, mostrou-me um artigo científico que escrevera especialmente para a revista do Instituto Bitantã. Ele seria o salvador de todas as espécies em extinção. Bastaria colocar as próteses nos bichinhos.

Entusiasmado mostrou rabinhos de cachorro, para demonstrar alegria, rabinhos de canguru, para saltar mais longe, rabinhos de vaca para espantar moscas, rabinhos de chipanzé para subir em árvores.

Em compensação, eu morri de rir.



Todas as quartas-feiras, até as 18h, publico no blog um texto oriundo de matéria publicada no Correio Braziliense. Como numa coluna de jornal, o texto é limitado de 2959 a 2997 caracteres.

*imagem do sapo-arlequim, em extinção

4 comentários:

Carlos Cruz disse...

lembro do sapo cururu da minha infância, aquele que cantava quando tinha frio. primo do sapo chulé, hoje extinto, graças à xuxa.

criativa crônica, hermano.

manda pro leonardo, pra ver o que ele acha.

Klotz disse...

Obrigado, CC.
Sapo cururu não era aquele sapo cor de rosa que ficava à beira da lagoa engravidando virgens?

Enviarei ao Spao Léo.

Abraços.

Klotz disse...

Comentário do Sapo Léo enviada por e-mail:

Leonardo Quintela:
"Muito divertida suas crônicas Mr. Klotz. Eu, por exemplo, já fui sapo e hoje sou o príncipe em extinção... hehehe "

Klotz disse...

Por que será que os leitores preferem enviar e-mail a comentar no blog?

Será medo de virarem sapos?

 
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